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sábado, 2 de janeiro de 2010

A homenagem a Ghiggia


Amigos, a ferida de 1950 ainda dói na carne e na alma de cada brasileiro. Construímos o Maracanã para nele conquistar a suprema glória do futebol mundial. Vencemos México, Iugoslávia, Suécia e Espanha, as duas últimas de goleada. Somente faltava um empate contra o Uruguai, e a taça do mundo seria nossa. Tínhamos a certeza profética do título.

Duzentas mil pessoas inundaram o Maracanã naquele dezesseis de julho. Os outros milhões de brasileiros se voltaram para o estádio, como se rezassem para sua Meca. Brasileiros de branco, uruguaios de azul celeste, e a bola rolou no maior estádio do mundo. Mais noventa minutos, e a Taça Jules Rimet seria nossa.

No início do segundo tempo, Friaça fez 1 a 0. Se o empate já estava bom, a vitória transformava otimismo em certeza. O mundo estava aos pés do Brasil. O Maracanã consagraria a Seleção Brasileira como campeã mundial de futebol. Faltavam menos de quarenta e cinco minutos.

Aos 20 minutos do segundo tempo, o uruguaio Schiaffino empata: 1 a 1. Sofrer um gol sempre é ruim, mas o empate ainda era nosso. Em menos de meia hora, a Copa do Mundo estaria nas nossas mãos.

Três dias antes, em São Paulo, o Uruguai perdia para a Suécia. Então, Ghiggia avançou pela direita, ganhou na corrida do zagueiro sueco, e chutou na saída do goleiro. Era o empate do Uruguai. Voltando a 16 de julho, aos 34 minutos do segundo tempo Ghiggia avançou pela direita, ganhou na corrida do zagueiro brasileiro, e chutou na saída de Barbosa. Era a virada do Uruguai.

Os duzentos mil presentes nas arquibancadas, gerais e cadeiras faziam o maior silêncio da história. Naquele momento, Ghiggia cravava, no peito de cada brasileiro, uma adaga que machucava o corpo e a alma. O sonho de uma nação inteira era destruído por um gol. O Uruguai era bicampeão mundial, em nossa casa.

Durante mais de 59 anos, cada brasileiro nutriu, dentro de si, mesmo sem querer, um ódio à figura de Alcides Ghiggia. Embora o craque uruguaio estivesse apenas cumprindo a obrigação de sua profissão, o rancor brasileiro era compreensível. Mas Ghiggia se sentia magoado, é claro: ninguém gosta do fato de ser odiado por uma multidão.

Porém, no último dia 29 de dezembro, tudo mudou. O Brasil teve um dos gestos mais nobres da história da nação. Chamamos Ghiggia ao Maracanã, e gravamos seus pés, para sempre, na calçada da fama do Estádio Mario Filho. Uma justa homenagem a um craque que fez história no templo sagrado. Ghiggia foi um dos primeiros grandes nomes da história do Maracanã, ao lado de Didi, Ademir e Zizinho. Depois viriam Castilho, Nilton Santos, Garrincha, Pelé e tantos outros. Eis a verdade: Ghiggia é uma das estrelas dessa constelação, e portanto merecia a homenagem.

O carrasco uruguaio não sente mais mágoa nenhuma. Seu discurso foi muito bonito: "Nunca pensei que seria homenageado no Maracanã, estou muito emocionado. Agradeço profundamente. Viva o Brasil!".

Viva o Brasil, viva o Uruguai, e viva Alcides Ghiggia!

PC

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