Páginas

domingo, 25 de julho de 2010

Os Últimos Dias do Imperador

(por Carlos Clark)

Depois de uma derrota estrondosa, capitaneada por um par de fios desencapados ortodoxos, o Imperador se vê à frente do desafio dantesco de erguer uma Copa do Mundo em sua república bananeira, em menos de 4 anos. É muita negociata. Mesmo para uma velha e bêbada raposa como ele.

- Judeu filhadaputa! Como não vai botar dinheiro no Mosqueteirão? No Cícero nem por um caralho! Aquele galego me fudeu. Rodriguinho! Liga pro teu Brother e diz pra ele ir pra merda!

- Tô ligando, chefe.

- Puta que o pariu! E ainda tenho que achar esta merda deste esparro. Rodriguinho!

O cargo de técnico da seleção brasileira, pela importância, deveria estar subordinado a uma diretoria própria, um departamento de seleções. Esse departamento hoje atende pela alcunha de "o genro". E não tem expediente. Onde quer que ele esteja, ele exerce a sua "masjestade". Negócios. São apenas - e tudo - negócios. Por isso, haveria de se esperar um mínimo de profissionalismo. Mínimo. A realidade, bem outra.

- Rodriguinho, hoje depois do jogo você vai falar com ele no Maracanã. O juiz já está acertado e os mineiros tão tranquilos. De cabeça inchada ele vai aceitar na hora. Eu quero ele.

- Certo, chefe. Acabei de falar com o Eric e amanhã de manhã a equipe dele vai esperar a gente no clube.

- Lá eu ganho este filho da puta e de quebra ainda fodo com aquela baleia. Lembra que foi lá que eu convoquei o Baixinho aquela vez? Caralho, aquela porra é melhor que aquela sede barata que eu comprei. Vou abrir um escritório lá. Porra! Cadê o Scotch que eu pedi!

Dito e feito. Menos a parte do juiz, que tentou e não impediu a conquista da liderança pelo Professor Rebelde.

Então, o cargo de técnico da seleção é decidido assim, de sopetão, sem avisos, sem rodeios, é pegar ou largar, pelas costas do clube líder do campeonato, afiliado e participante de um campeonato organizado pelo próprio Imperador. Muy bueno.

Manhã de sexta, tomando um cafezinho barato de 2 reais, sentam-se Rodriguinho, o Imperador e a vítima. Sem rodeios, Rodriguinho faz o convite.

- Metade do que você ganha lá, é pegar ou largar!

- Dinheiro não é problema. Mas vocês vão me segurar até a Copa?

O Imperador se manifesta de forma brusca.

- Não, peraí, não é assim que a banda toca. Na Olimpíada é que eu vou ver se a sua renovação vai funcionar. Se me trouxer o ouro, vai pra Copa. Se não, eu não tenho como te segurar, com o contrato do Gauchão vencendo na mesma época.

-Tudo bem, eu quero, mas preciso falar com o Patrocinador antes de falar com a imprensa, certo? Toca aqui.

"Não era isso. Não era essa a resposta" - pensa o Imperador. Vácuo.

Enquanto isso lá fora…

- Porra Eric? Mandaram você vir cobrir esta merda de torneio? Quem tá aí?

- Ih, rapaz, vocês vão furar a minha exclusiva? Não faz isso não! Tem volta!

- Peraí! Quem tá ali não é o… e o…! Valmir! Acorda e traz a camêra pra cá! Agora!

Pouco depois, no táxi, ao celular:

- Oi Doutor, é verdade sim, eu vim tomar café com o Imperador e ele me convidou… é… Eu até queria ir, mas eu não sei… não senti firmeza… não tem projeto nenhum, não tem estrutura nenhuma, só aquela concentração na serra e uma secretária pra 5 caras aqui na Barra…

- Sei… aquele urubu vagabundo queria dar uma perna de anão na gente… - Marta! Cadê o meu scotch, porra!

- Não vou ser o louco que vai dizer que não quer ir pra seleção, mas a gente precisa fazer alguma coisa, Doutor. Não quero me misturar com essa gente não.

- Do Laranjal você não sai de jeito nenhum. Eu vou cobrar isso de você!

- Nem precisa, Doutor, eu gosto, quero ficar, não quero aporrinhação na minha vida. Eu sou novo, deixa eu jogar uma Copa na Europa em 2018.

- Então chega lá, bota o tênis, vai treinar e a gente resolve.

O resto é história. Uma negociata escusa, sorrateira, mal-intencionada, prepotente e que foi rechaçada à altura por pessoas de bem e pessoas de nem tão bem assim, que, por momentos, tiveram a altivez de se portar como verdadeiros tricolores.

O Imperador, que foi ungido ao cargo sem ter nenhuma experiência esportiva, que legado administrativo deixará? Quem será "feito" seu sucessor? O que esperar?

Hoje, um momento épico para o futebol, amanhã o sonho de estádios e castelos mirabolantes, regados por uma cornucópia eterna, pode ruir fragorosamente.

Quatro anos passam rápido.

4 comentários:

  1. Sensacional esse texto!!!

    Parabéns, Carlos Clark!

    Além de retratar a sujeirada, é divertido de ler.

    ResponderExcluir
  2. Engraçado é que o texto retrata dois mafiosos, sendo que um tricolor e outro rubro-negro.

    ResponderExcluir
  3. bingo! este foi + um capítulo das gangster wars.

    ResponderExcluir
  4. Carlos, este para mim foi o relato mais fiel do fatídico "Dia do Fico".

    Quero saber como você escondeu o microfone na camisa do Muricy. Um dia você me conta.

    ResponderExcluir

Regras para postar comentários:

I. Os comentários devem se ater ao assunto do post, preferencialmente. Pense duas vezes antes de publicar um comentário fora do contexto.

II. Os comentários devem ser relevantes, isto é, devem acrescentar informação útil ao post ou ao debate em questão.

III. Os comentários devem ser sempre respeitosos. É terminantemente proibido debochar, ofender, insultar e/ou caluniar quaisquer pessoas e instituições.

IV. Os nomes dos clubes devem ser escritos sempre da maneira correta. Não serão tolerados apelidos pejorativos para as instituições, sejam quais forem.

V. Não é permitido pedir ou publicar números de telefone/Whatsapp, e-mails, redes sociais, etc.

VI. Respeitem a nossa bela Língua Portuguesa, e evitem escrever em CAIXA ALTA.

Os comentários que não respeitem as regras acima poderão ser excluídos ou não, a critério dos moderadores do blog.