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sábado, 2 de agosto de 2014

Uma análise sobre o erro do Fluminense na questão dos ingressos


Como publiquei aqui recentemente, o Fluminense rasgou um compromisso assumido há dois meses com sua torcida, e simplesmente dobrou os preços dos ingressos dos jogos do clube no Campeonato Brasileiro. Mesmo assim, a torcida tricolor, esta maravilhosa legião de fanáticos, ignorou a quebra de palavra dos dirigentes tricolores, e comparecerá em peso ao Maracanã neste domingo (já foram vendidos mais de 20 mil ingressos). E pensar que já vi estes diretores energúmenos do Fluminense culparem esta mesma brava torcida por problemas causados por eles próprios...

Bom, na quarta-feira 30, meu amigo Marcelo Savioli publicou uma análise que considerei praticamente perfeita sobre o assunto. Tomo a liberdade de copiá-la abaixo. (quem quiser acessar o post original em OTricolor.com, clique aqui). É uma aula de como um clube profissional deve tratar seus torcedores, clientes e sócios. Valeu, Savioli!

O Fluminense errou, apresentou a conta para o torcedor pagar na maior cara de pau e ainda quebrou o contrato

Todos devem saber que na Europa torcedores de muitos clubes podem adquirir de uma só vez seus ingressos para o ano todo. Isso ocorre porque os referidos clubes adotam o planejamento como ferramenta de gestão e assim podem precificar toda a temporada. Eles sabem quanto querem ganhar, eles fazem estudos de Marketing para estimar a demanda e, com base em estudos, que não são nenhuma coisa do outro planeta, estabelecem o preço.

Nem é preciso dizer que se trata de uma prática bem sucedida.

Eis que, meus amigos, minhas amigas, surgiu no Brasil o primeiro time a divulgar antecipadamente os preços dos ingressos para todo o Campeonato Brasileiro. Quase um escândalo em se tratando de Brasil.

Antes de entrar no mérito dos lamentáveis fatos recentes, vale ressaltar que eu fui um crítico dos preços propostos pelo Fluminense. Como eu não estou aqui para ser popular e sim para tentar ajudar meus leitores a entenderem o que está acontecendo com o Fluminense e com o ambiente em que está inserido, tanto podem me ver aqui criticando a voracidade das políticas de preço adotadas em 2011 como o excesso ao contrário praticado nos últimos meses ao se fixar preços tão baixos.

Para quem acompanha esse blog, é totalmente dispensável lembrar que sempre vi com desconfiança o processo que levou à fixação dos preços. Será que a decisão foi fruto de um estudo ou não passou de um arroubo populista, uma jogada para a plateia, um balãozinho para trás no meio de campo?

Tirando isso, teci rasgados elogios à então nova política. O conceito estava certíssimo e aí eu posso falar como especialista em Marketing. O Fluminense decidiu investir na fidelização de seus torcedores, resolveu focar nos resultados de longo prazo. Vou repetir aqui que o ponto nevrálgico na estratégia adotada era aquilo que eu venho defendendo exaustivamente há anos, que é o esforço para criar, ou recriar, o hábito do torcedor de ir ao estádio, transformar a ida ao Maracanã em parte da rotina. Estamos falando ainda em formar plateia para o futuro, porque os pais, com o ingresso barato, vão e levam os filhos. E por aí vai…

A ideia de divulgar os preços, independente deles serem os mais adequados, até o final do ano me arrancou um sorriso maior que o espelho. Ora bolas, era o Fluminense mais uma vez sendo pioneiro, investindo no espetáculo da arquibancada, que é, para grande parte dos torcedores, tão importante quanto o do campo; era o Fluminense rompendo a barreira da limitação da visão de curtíssimo prazo. Já estava eu imaginando que o clube iniciaria o ano de 2015 com o preço de todos os jogos da Libertadores, da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro fixados. Já sonhava com o clube comercializando cartelas até o final do ano tão logo saísse a tabela do Campeonato Brasileiro. Cheguei a imaginar o clube trabalhando com pacotes diferentes para cada gosto, tudo customizado, com o ingresso ficando mais barato na medida que o cliente comprasse pacote com mais jogos, numa forma de premiar a fidelidade. Imaginei ainda que o Sócio Futebol poderia ter acesso a esses pacotes pela metade do preço.

Pois é… Mas tu é besta, Savioli, dirá o leitor puxando no “s” à mineira, imitando o pessoal do interior. Afinal de contas, nós estamos no Brasil, não é verdade? E eu que detesto essa mania que as pessoas têm de depreciar nosso país, sou obrigado a colocar o rabo entre as pernas e aceitar resignado. Estamos no Brasil.

O Fluminense, ao revogar a tabela de preços que ele mesmo fixou, antes de tudo comprova que a política ora proposta foi, como eu desconfiava, temerária, sem respaldo em qualquer estudo de elasticidade de preço e demanda, impacto nas finanças e nos resultados econômicos, tanto da bilheteria quanto dos planos de sócio. Aliás, isso é fácil de perceber pelas palavras do vice presidente de Projetos Especiais, que revela que no mês de agosto o negócio sai mais caro para o sócio futebol que para o torcedor comum. Uma pérola! Aliás, eu queria entender – nada contra a pessoa, que nem conheço e pretendo ter o prazer de entrevistar em breve – por qual razão quem está respondendo pela mudança é o vice presidente de Projetos Especiais. Trata-se de uma questão tática de Marketing. O que tem a ver isso com projetos especiais?

A gente pega, junta tudo isso, e chega à conclusão que o Fluminense está administrativamente uma bagunça, que a profissionalização do clube não passou de uma falácia de campanha. E não é esse o primeiro sintoma de falta total de profissionalismo, de gestão e de planejamento no clube. É só ver o entra e sai do início do ano em pastas estratégicas, algo, no meu entender, inconcebível para quem pensa em profissionalização do clube.

O segundo problema dessa manobra desastrada, que vai deixar sequelas na relação entre o clube e seu torcedor, é a quebra de contrato. Sim, de contrato, a partir do momento que o entendimento seja de palavra dada, palavra cumprida. O Fluminense, um clube que vive de tentar resgatar suas tradições, não pode dar um exemplo desses. Inclusive – não me aprofundei ainda no tema – isso pode gerar problemas jurídicos para o clube com base do Código de Defesa do Consumidor. Eu não acredito que nenhum torcedor do Fluminense, por mais indignado que esteja, vá incorrer no risco de prejudicar o clube. Do ponto de vista do consumidor, seria plenamente justificável acionar o clube, do ponto de vista do torcedor seria inaceitável.

Outrossim, logo que surgiram os rumores, a primeira coisa que pensei foi que o clube poderia ter procurado os seus torcedores para debater uma mudança da política em pleno curso, fosse através de enquetes, pesquisa, debate, fosse o que fosse. Eu mesmo estaria aqui defendendo a mudança com base na percepção que eu mesmo tenho de que o clube pode ganhar muito mais com o mesmo número de torcedores no estádio, com base no entendimento das dificuldades financeiras do clube. O que não pode é o clube assumir publicamente que errou e oferecer a conta para o torcedor pagar. O Fluminense precisa evoluir muito na forma como trata seu torcedor, o diálogo tem que melhorar. Esse caso, para irmos ao último e mais desagradável dos tópicos, é igual quando você faz uma dívida e não consegue pagar. O que você faz? Para de pagar, chega junto ao credor e diz que daqui para a frente você vai pagar a metade do valor das parcelas ou você senta com ele, diz que não está conseguindo pagar e negocia uma forma para seguir honrando o compromisso de uma forma que não traga danos para nenhuma das partes?

A pior de todas as decepções, porém, é ter que ouvir que o clube não terá preços fixos, que eles serão variáveis e serão estipulados com base em critérios que não chegam a ser subjetivos, mas deixam o clube à vontade para fazer como o Flamengo na Copa do Brasil do ano passado, que traiu seus torcedores e – pasmem! – teve queda brutal no número de associados. E isso abre uma outra frente de raciocínio. Será que o Sócio Futebol ficaria infeliz por estar pagando R$ 5,00 no jogo contra o Goiás, enquanto o torcedor comum paga R$ 10,00? Será que ele está tão indignado com o fato de gastar mais para ir ao Maracanã que o torcedor comum em determinados períodos, que prefere pagar mais caro só para não dar essa prerrogativa? E o direito a voto, que tanto se tem propalado como benefício? E os descontos que o associado tem? E a facilidade de compra pela internet? Nada disso tem valor? Ou será que tudo não passa de desculpa esfarrapada?

O que me deixa mais triste nisso é perceber que a profissionalização do clube não vingou, que o Fluminense se comunica e se relaciona de forma primitiva com seus torcedores, mas, acima de tudo, é que meu sonho besta não vai se realizar. Lembram do sócio futebol comprando um pacote de ingressos para o ano todo pagando 50% do valor do pacote escolhido? E eles querem me convencer de que tudo isso é para proteger o interesse do Sócio Futebol, que, assim como o torcedor comum, vai pagar mais caro e ainda correrá o risco de, depois de acompanhar o clube fielmente, ficar de fora dos jogos finais porque o preço do ingresso não cabe no orçamento? É assim que pretendem fidelizar os associados e atrair novos clientes?

Como nunca é demais, fica meu apelo aos dirigentes do Fluminense para que pensem no que o clube pode ganhar no longo prazo, venham a público explicar as verdadeiras razões para essa decisão, o que o clube pode ganhar no curto prazo e precisa ganhar financeiramente. Fica meu apelo a que reatem o contrato que fizeram com os torcedores e fixem os preços dos ingressos até o final do ano, tanto na Copa do Brasil quanto no Brasileiro, mesmo que os jogos finais custem mais caro. Se o clube estiver mal, o que não vai acontecer, porque seremos campeões brasileiros, que se façam promoções. É simples, não dói, mas faz sorrir e tende a ser um fator de confiabilidade.

Saudações Tricolores!

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