domingo, 16 de agosto de 2009

Recordar é viver - O Fla-Flu de 1963


FOTO: o goleiro Marcial salva o Flamengo no Fla-Flu de 1963.

Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1963.

Amigos, a decisão do Campeonato Carioca de 1963 foi o Fla-Flu mais aguardado de todos os tempos. O Flamengo podia empatar, e o Fluminense tinha que vencer. Com as crônicas de Nelson Rodrigues n'O Globo convocando vivos, doentes e mortos, nunca o Maracanã comportou tanta gente.

As roletas registraram inacreditáveis 194.603 presentes. Em toda a história do Maracanã, apenas dois jogos superaram esta marca (Brasil 1 x 2 Uruguai, 16/07/1950, 199.854 presentes; e Brasil 4 x 1 Paraguai, 21/03/1954, 195.513 presentes).

O número de pagantes também foi espantoso: 177.656 pessoas pagaram ingresso. Em toda a história do Maracanã, apenas um jogo superou esta marca (Brasil 1 x 0 Paraguai, 31/08/1969, 183.341 pagantes).

Fla-Flu é Fla-Flu e basta, já dizia Nelson Rodrigues. O recorde de público do futebol mundial é apenas mais um fator que comprova a grandeza do clássico das multidões.

FOTO: o ponta-direita rubro-negro Espanhol passa por Altair, lateral-esquerdo tricolor.

O empate dava o título para o Flamengo, de modo que o Fluminense lançou-se todo para o ataque, principalmente no segundo tempo. A cada minuto que se escoava, a taça ficava mais distante de Laranjeiras, e por conseguinte mais próxima da Gávea.

Os últimos dez minutos registraram uma pressão sufocante do Tricolor sobre o Rubro-Negro. O pó-de-arroz Escurinho desperdiçou duas chances cara a cara com o goleiro flamenguista Marcial. Porém, toda a pressão do Fluminense foi em vão, pois a batalha terminou mesmo zero a zero.

Com o empate sem gols, o Flamengo sagrou-se campeão da cidade, dando fim a um jejum de oito anos sem título. Foi também a primeira vez que o Flamengo foi campeão em cima do maior rival.

PC

Ficha técnica: Flamengo 0 x 0 Fluminense.
Decisão do Campeonato Carioca de 1963.
Data: 15/12/1963.
Local: Maracanã, Rio de Janeiro/RJ.
Fluminense: Castilho; Carlos Alberto Torres, Procópio, Dari e Altair; Oldair e Joaquinzinho; Edinho, Manoel, Evaldo e Escurinho. Técnico: Fleitas Solich.
Flamengo: Marcial; Murilo, Luís Carlos, Ananias e Paulo Henrique; Carlinhos e Nelsinho; Espanhol, Airton, Geraldo e Oswaldo. Técnico: Flávio Costa.
Árbitro: Cláudio Magalhães.
Público pagante: 177.656 (o maior da história em jogos interclubes no mundo).
Público presente: 194.603 (o maior da história em jogos interclubes no mundo).
Renda: CR$ 57.993.500,00 (recorde histórico na época).

Vídeo do Canal 100 sobre a partida:

Crônica de Nelson Rodrigues sobre a finalíssima:

Continuo Tricolor

Amigos, ao terminar o grande Fla-Flu, o profeta tratou de catar os trapos e saiu do Maracanã, mas de cabeça erguida. Era um vencido? Jamais. Vencido, como, se temos de admitir esta verdade límpida e clara - o Fluminense jogou mais. Não cabe, contra a evidência da nossa superioridade, nenhum argumento, sofisma ou dúvida. Alguém dirá que o profeta não previa o empate.

Exato. Mas vamos raciocinar. Houve lances, no Fla-Flu, que escapariam à vidência até de um Maomé, até de um Moisés de Cecil B. de Mille. Lembro-me de um momento, em que Marcial estava batido, irremediavelmente. O arco rubro-negro abria seus sete metros e quebrados. E que fez Escurinho? Enfiou a bola na caçapa? Consumou o "goal" de cambaxirra?

Simplesmente, Escurinho levantou para Marcial. Deu a bola na bandeja como se fosse a cabeça de São João Batista. E eu diria que nem Joana D’Arc, com suas visões lindas, ou Maomé pendurado no seu camelo, ou o Moisés de Cecil B. de Mille, do alto de suas alpercatas - podia imaginar tamanha ingenuidade. Escurinho teria de chutar rente à grama, ou alto, se quisesse, mas teria de chutar e nunca suspender a bola.

E tem mais. Os profetas de ambos os sexos jamais poderiam contar com a trave. No segundo tempo, Escurinho mandou uma bomba. Nenhum "goal" foi tão merecido. Pois bem: - vem a trave e salva. Além do mais que Maomé, ou que Moisés podia calcular que Solich ia fazer jogo para empate? Dirá o próprio que não foi esta a sua intenção. Mas o fato incontestável é que ele armou o time para o hediondo 0 x 0.

É obvio que, desde o primeiro minuto, o Fluminense teria de se atirar todo para a frente. Era preciso forçar a decisão, o"goal", a vitória, já que o empate seria a catástrofe. O tricolor jogou bem e, no entanto, não deu, nunca, a sensação de fome e sede de "goal". Faltavam uns 15 minutos, e os nossos jogadores ainda tramavam, ainda faziam tico-tico, ainda perdiam tempo com passes curtos, para os lados e para trás. Sim, o Fluminense jogou bem e não cabe preciosismo num último Fla-Flu.

Já contra o Bangu, aconteceu o seguinte: - sempre que Oldair avançava, eis que Solich erguia-se na boca do túnel e fazia um comício. Oldair marcou dois "goals" por desobediência e repito, por indisciplina tática. Ontem, ele estava cá atrás, defendendo um empate que seria a vitória do Flamengo. Vejam que tristeza horrenda: - jogamos bem e errado.

Dizia eu que o profeta estava certo no mérito da questão. O tricolor é o melhor, foi melhor, teve mais time. Mas há, claro, um campeão oficial, que é o Flamengo. E aqui, abro um capítulo para falar da alegria rubro-negra, santa alegria que anda solta pela cidade. Nada é mais bonito do que a euforia da massa flamenga. À saída do estádio, eu vi um crioulão arrancar a camisa diante do meu carro. Seminu, como um São Sebastião, ele dava arrancos medonhos. Do seu lábio, pendia a baba elástica e bovina do campeão.

Mesmo que eu fosse um Drácula, teria de ser tocado por essa alegria que ensopa, que encharca, que inunda a cidade. Eu não sei se o time do Flamengo, como time, mereceu o título. Mas a imensa, a patética, a abnegada torcida rubro-negra merece muito mais. Cabe então a pergunta: - quem será o personagem da semana de um abnegado Fla-Flu tão dramático para nós? Um nome me parece obrigatório: - Marcial. E nessa escolha, está dito tudo. Quando o goleiro é a figura mais importante de um time, sabemos que o adversário jogou melhor. Castilho teve muito menos trabalho. Claro que eu não incluo, entre os méritos de Marcial, o "goal" que Escurinho não fez. Tão pouco falo na bomba que o mesmo Escurinho enfiou na trave. Assim mesmo Marcial andou fazendo intervenções decisivas, catando bolas quase perdidas.

Amigos, eu sei que os fatos não confirmaram a profecia. Ao que o profeta só pode responder: - "Pior para os fatos!" É só.

(O Globo, 17/12/1963)

Fontes de pesquisa:
- Canal 100.

4 comentários:

  1. O Flamengo e sua sorte sem fim...cagão desde os tempos do profeta!!!

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  2. Vc deve ser botafoguense né, um eterno chorão hahahahahahahahaha...

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  3. Flamengo sempre foi freguês do fluminense...e sempre será.

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  4. O goleiro do Flamengo entrou em campo para defender o Flamengo.Fê-lo de forma soberba.

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