Um dos que vestem vermelho e preto chuta de fora da área, e instantaneamente o Maracanã inteiro silencia. Enquanto a bola voa em direção à meta defendida pelo arqueiro tricolor, uma tensão irresistível toma conta do ar. Lá e cá, os olhos esbugalhados, as bocas abertas, os corações palpitando. O goleiro do Fluminense não vai alcançar... não alcançou. A rede, aquele lindo véu que pende do travessão tão graciosamente, balança. O silêncio sepulcral ainda persiste, por mais um segundo. E então vem, lá do outro lado, o urro colossal. É gol do Flamengo.
Eis uma das sensações mais espetaculares que o Maracanã pode proporcionar ao torcedor: um gol do rival. É como levar um soco na cara (às vezes dói até mais). É como acordar de um sonho bom ouvindo aquele diabólico despertador. É como levar um tombaço na escada, com seu vizinho babaca olhando e gargalhando. É tudo isso junto e muito mais. (Em outros estádios, o efeito também existe, claro, mas no Mario Filho é - ou era, vai saber - bastante amplificado.)
O único consolo durante a comemoração do rival é saber que, quando o Fluminense empatar - porque ele vai empatar, claro - eles, lá no outro lado, viverão a mesmíssima sensação. E quando o Tricolor empata e depois vira, gritamos o mais alto que conseguimos - eles merecem o mesmo tratamento que nos deram, afinal.
O Fla-Flu completa um século. Tudo começou naquela tarde de 7 de julho de 1912, no campo de Laranjeiras, que nem era um estádio ainda. Enquanto o Fluminense era o campeão invicto, o Flamengo nem queria saber de futebol, estava bem só com o remo. Mas nove titulares tricolores brigam e resolvem sair para outro clube. O grande rival Botafogo não era opção, então batem à porta do Flamengo. O rubro-negro reluta, mas acaba aceitando, desde que o uniforme do football fosse diferente do uniforme das regatas. Feito: os novos flamenguistas vestiriam a papagaio-vintém.
Voltando ao fatídico 7 de julho: pela primeira vez, os ex-tricolores enfrentavam a camisa que os fizera campeões. Eram, obviamente, os favoritos: seus ex-reservas dificilmente conseguiriam fazer frente. Entretanto, o jogo acontece e o Fluminense vence, contra todas as previsões. Sim, um triunfo improvável, quase impossível. Uma vitória que jamais poderá ser vingada. Nascia o maior de todos os clássicos, forjado no ressentimento.
Em cem anos, o Fla-Flu viveu de tudo. Quase quatrocentas batalhas. Onze decisões épicas. O maior público da história. Dezenas de agentes duplos (do desertor Alberto Borgerth nos primórdios a Thiago Neves recentemente, passando por Doval, Caju, Nunes, Edinho, Aílton e Renato Gaúcho). As crônicas de Nelson Rodrigues. O pênalti defendido por Marcos Carneiro de Mendonça diante do Presidente da República. A batalha da Lagoa pelo Campeonato de 1941. Os milagres de Castilho. O gol de Flávio na decisão de 1969. A chuvosa apoteose de Manfrini. Um empate na Espanha. As cobranças de falta de Zico. As duas pérolas de Assis. Um maestro chamado Júnior. Um super-herói chamado Ézio. A barriga de Renato. O inusitado WO duplo. O pênalti sobrenatural de Cássio. O olé de dois eternos minutos.
Vai lá, mestre Nelson: "O Fla-Flu não tem começo. O Fla-Flu não tem fim. O Fla-Flu começou quarenta minutos antes do nada. E aí então as multidões despertaram!".
PC
Em cem anos, o Fla-Flu viveu de tudo. Quase quatrocentas batalhas. Onze decisões épicas. O maior público da história. Dezenas de agentes duplos (do desertor Alberto Borgerth nos primórdios a Thiago Neves recentemente, passando por Doval, Caju, Nunes, Edinho, Aílton e Renato Gaúcho). As crônicas de Nelson Rodrigues. O pênalti defendido por Marcos Carneiro de Mendonça diante do Presidente da República. A batalha da Lagoa pelo Campeonato de 1941. Os milagres de Castilho. O gol de Flávio na decisão de 1969. A chuvosa apoteose de Manfrini. Um empate na Espanha. As cobranças de falta de Zico. As duas pérolas de Assis. Um maestro chamado Júnior. Um super-herói chamado Ézio. A barriga de Renato. O inusitado WO duplo. O pênalti sobrenatural de Cássio. O olé de dois eternos minutos.
Vai lá, mestre Nelson: "O Fla-Flu não tem começo. O Fla-Flu não tem fim. O Fla-Flu começou quarenta minutos antes do nada. E aí então as multidões despertaram!".
PC
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Regras para postar comentários:
I. Os comentários devem se ater ao assunto do post, preferencialmente. Pense duas vezes antes de publicar um comentário fora do contexto.
II. Os comentários devem ser relevantes, isto é, devem acrescentar informação útil ao post ou ao debate em questão.
III. Os comentários devem ser sempre respeitosos. É terminantemente proibido debochar, ofender, insultar e/ou caluniar quaisquer pessoas e instituições.
IV. Os nomes dos clubes devem ser escritos sempre da maneira correta. Não serão tolerados apelidos pejorativos para as instituições, sejam quais forem.
V. Não é permitido pedir ou publicar números de telefone/Whatsapp, e-mails, redes sociais, etc.
VI. Respeitem a nossa bela Língua Portuguesa, e evitem escrever em CAIXA ALTA.
Os comentários que não respeitem as regras acima poderão ser excluídos ou não, a critério dos moderadores do blog.