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Charge: Mario Alberto. |
Apesar de tudo isso, vez por outra os tricolores são obrigados a ler ou ouvir que "o Fluminense é o time do tapetão", que "o Fluminense é o clube mais sujo do Brasil", que "o Fluminense é o clube mais ajudado do país", que "o Fluminense deve a Série B". O objetivo deste post é demonstrar que não, o Fluminense não é sujo, não é ajudado, e não "deve" campeonato nenhum a ninguém; e que quem utiliza este tipo de argumento está apelando para falácias e mentiras, já totalmente desmascaradas.
A conversa fiada da suposta
"dívida" do Fluminense começa em 1996, ano em que, pela primeira vez em sua história, o clube terminou o Campeonato Brasileiro entre os últimos colocados - o que resultaria no rebaixamento para a Série B. Entretanto, no ano seguinte, escutas telefônicas comprovaram que
Ivens Mendes, então presidente da CONAF (Comissão Nacional de Arbitragem de Futebol), combinou resultados com os dirigentes de Corinthians e Atlético Paranaense, no caso que ficou conhecido como "1-0-0". Escândalos parecidos em outros países do mundo resultaram em punições severas, inclusive rebaixamentos dos clubes envolvidos, mas aqui a impunidade venceu. O Atlético Paranaense recebeu a branda punição de 5 pontos descontados no Campeonato de 1997 - e o poderoso Corinthians, nem isso. Fluminense e Bragantino tiveram, natural e justamente, seus rebaixamentos cancelados - afinal, o Campeonato Brasileiro de 1996 estava comprometido.
Não se pode, evidentemente, falar em "dívida" do Fluminense neste caso. Se há "devedores" aqui, são os clubes envolvidos nas manipulações de resultados, claro. (vide
post A verdade sobre 1996)
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Trechos dos diálogos de Ivens Mendes com dirigentes de Corinthians e Atlético Paranaense. |
No Campeonato Brasileiro de 1997, o Fluminense voltou a ser rebaixado, em uma competição com diversas arbitragens prejudiciais ao clube. Ficou evidente o intuito de alguns árbitros de fazer
"justiça" com o próprio apito, como se o Fluminense fosse culpado de alguma coisa. Ainda assim, o Fluminense aceitou o resultado do torneio, e foi disputar a Série B em 1998 -
logo, novamente, não se pode falar em "dívida" alguma.
(uma observação relevante: se o Corinthians tivesse sofrido a mesma punição de 5 pontos que o Atlético Paranaense sofreu pelo caso Ivens Mendes, o clube paulista também teria sido rebaixado em 1997, como se pode verificar na tabela final do Campeonato. Ouvi algum corinthiano gritando "PAGUE A SÉRIE B"
? Ah, tá!)
Em 1998, o Fluminense cumpriu o rebaixamento sofrido no ano anterior, e disputou, conforme o previsto, a Série B, um torneio com um regulamento bastante exótico, com apenas dez rodadas. Para o leitor ter uma ideia do absurdo: na última rodada, o Fluminense poderia tanto se classificar para a fase seguinte, quanto ser rebaixado para a Série C (!). O Tricolor acabou não conseguindo a vitória de que precisava, e assim sofreu o inimaginável descenso para a terceira divisão do futebol nacional. Então, o que fez o dito "clube do tapetão", "o mais ajudado", "o mais sujo do país"? Adivinhem: foi disputar a Série C, com a maior dignidade do mundo. E até no pior momento de sua história, demonstrou sua grandeza, ao contratar simplesmente Carlos Alberto Parreira - o treinador campeão da Copa do Mundo de 1994 - para dirigir o clube no fundo do poço.
Essa os detratores não explicam: como pode o Fluminense, este clube que "é o rei do tapetão", que "sempre vira a mesa", ter ido a campo jogar a terceira divisão do Campeonato Brasileiro de 1999? Como os "poderosos tricolores da CBF e do STJD" deixaram isso acontecer? Onde estava o Fluminense em 1999? Sim, estava disputando a Série C, cumprindo o rebaixamento sofrido, exatamente conforme o previsto nos regulamentos assinados - por mais estapafúrdios que estes fossem. Em dezembro, após a disputa do quadrangular final com Náutico, Serra e São Raimundo, o Fluminense, glorioso Campeão Brasileiro de 1970 e 1984, levantava a taça da Série C, e começava sua subida de volta à elite do futebol nacional, no campo. Sem "dívida" alguma, portanto.
Paralelamente, era disputada a Série A do Brasileirão, que teria o Corinthians como campeão e uma grande polêmica na briga contra o rebaixamento. O São Paulo escalara, em diversas partidas, o atacante
Sandro Hiroshi, irregularmente. Então, Botafogo e Internacional, os clubes grandes que brigavam contra o descenso, conseguiram na Justiça Desportiva os pontos das partidas contra o time paulista. (No entanto, os outros clubes que jogaram contra Sandro Hiroshi não receberam os pontos de seus jogos.) O Botafogo, que perdera a partida contra o São Paulo por 6 a 1, escapou do rebaixamento exatamente graças aos pontos concedidos pelo tribunal. O modesto Gama, do Distrito Federal, cairia no lugar do Alvinegro, mas não aceitou a situação e ingressou com ação na Justiça Comum. Estava armada a confusão.
(Abro parênteses para uma observação relevante: em 1996, o Fluminense poderia ter conquistado na Justiça os pontos do jogo contra o Santos, que escalara o atleta colombiano Usuriaga de maneira irregular - pontos que, se computados, seriam suficientes para que o clube escapasse do rebaixamento - ainda assim, preferiu o fair-play
e não recorreu ao tapetão, vejam só!, que "clube sujo" é esse tal de Fluminense! Duvidam dessa demonstração de fidalguia? Leiam na matéria do portal Globoesporte.com.)
Para evitar punições da FIFA devido à ação do Gama na Justiça Comum, a CBF abriu mão de organizar o Campeonato Brasileiro de 2000. Foi criada, então, pelo Clube dos 13, a Copa João Havelange, para substituir o Brasileirão, com mais de 100 clubes participantes, dentre os quais, naturalmente, o Fluminense. O Tricolor, que se preparava para disputar a Série B, simplesmente não pôde disputá-la, porque ela não aconteceu, devido a problemas totalmente alheios ao próprio Fluminense - a confusão causada pelo caso Sandro Hiroshi. Novamente, portanto, não se pode falar em "dívida" alguma nesse caso.
"Ahhh, mas o Fluminense foi colocado no módulo principal, e deveria estar no módulo equivalente à Série B!". Repito: não havia "módulo equivalente à Série B". Todos os módulos da Copa João Havelange faziam parte da primeira divisão! Tanto foi assim que, ora, o São Caetano, oriundo do módulo dito inferior, acabou como vice-campeão da competição, conquistando até uma vaga na Copa Libertadores de 2001, o que, evidentemente, não seria possível se houvesse um "módulo equivalente à Série B".
Os fatos: o Fluminense fez uma excelente campanha na Copa João Havelange, terminando a primeira fase em 3º lugar em seu módulo (à frente até mesmo do Vasco, que viria a ser o campeão). Após ser eliminado nas oitavas-de-final, pelo São Caetano, o Tricolor terminou a competição na 9ª colocação - como pode ser verificado na
tabela final do Campeonato.
A CBF oficializou a Copa João Havelange como o Campeonato Brasileiro de 2000 - dando o título de campeão ao Vasco, o título de vice-campeão ao São Caetano, e as vagas na Copa Libertadores de 2001 aos dois clubes. Portanto, eis o fato incontestável: o Fluminense foi, em campo, e de maneira indiscutível, o 9º colocado do Campeonato Brasileiro de 2000.
Em 2001, a CBF retomou a organização do Campeonato Brasileiro, e naturalmente utilizou a classificação do Campeonato do ano anterior para definir os clubes participantes. Obviamente, o Fluminense, 9º colocado de 2000, só poderia estar na Série A. Afinal, se até Santos (18º), Flamengo (19º), Botafogo (20º), Atlético Mineiro (24º) e Corinthians (28º) estariam, por que o Fluminense (9º) não estaria? Novamente, portanto, não se pode falar em "dívida" alguma aqui. Vale lembrar que o Fluminense novamente confirmou em campo que merecia estar na primeira divisão do Campeonato Brasileiro: chegou às semifinais, tanto em 2001, quanto em 2002. E, desde então, nunca mais foi rebaixado.
Nunca mais foi rebaixado, nem mesmo em 2013, ano da mais recente polêmica do Brasileirão, apesar de ter terminado o domingo da última rodada dentro da zona de rebaixamento. Afinal, ainda não eram conhecidas do público as escalações de atletas suspensos por parte de dois clubes concorrentes - o Flamengo e a Portuguesa. Conforme o regulamento da competição, as agremiações que infringiram as regras receberam as devidas punições - com unanimidade nas duas instâncias de julgamento, vale lembrar. As punições, naturalmente, fazem parte do resultado de campo da competição. Como se pode verificar facilmente
na tabela final do Campeonato, o Fluminense terminou a competição em 15º lugar, com o Flamengo em 16º e a Portuguesa em 17º.
Novamente, portanto, não se pode falar em "dívida" alguma nesse caso.
Nos parágrafos acima, fui o mais didático e detalhado possível. Acho que é o suficiente para demolir, de uma vez por todas, o bizarro argumento do "Pague a Série B". Por fim, vamos citar Nelson Rodrigues, que sempre faz bem: "A irritação que o Fluminense provoca é um sintoma nítido, inequívoco e taxativo de glória".
PCFilho